Tentativa e Erro, TRIZ e Motores a Jato

Na vida profissional, é comum usar o processo da tentativa e erro. Trata-se de tentar resolver um problema imediatamente após a primeira definição. Se a primeira ideia não funciona, gera-se uma segunda ideia, uma terceira, e assim por diante, até que alguma acabe dando resultado.

É natural a nossa tendência a tratar problemas por este processo de tentativa e erro. Estamos programados assim. Foi deste modo que aprendemos a andar, a falar, a escrever, a dirigir: tentando, errando, aprendendo com os erros e tentando novamente. Como diria o Jimmy Cliff: You can get it if you really want, (…) but you must try, try and try, try and try (…)

Se tivermos tempo sobrando, este processo é perfeito. Para uma criança, não faz muita diferença aprender a andar com 11 meses, ou 15 meses de idade. Ela não está sob pressão. Porém, a maioria das empresas não pode dar-se este luxo. Afinal, estamos na era do melhor, do mais rápido e do mais barato. Quem não é nenhum deles, ou está tentando ser, está mal.

Outro problema da tentativa e erro é que a primeira ideia que funciona, dificilmente, é a melhor solução para o problema. Usando a tentativa e erro, torna-se muito difícil superar a inércia psicológica: a tendência natural que temos de ficar limitados à nossa própria área do conhecimento e aos nossos padrões de comportamento.

O experiente engenheiro mecânico, dificilmente, irá especificar um capacitor para resolver um problema de projeto numa máquina, embora esta possa ser a solução mais racional e eficaz. Menos provável ainda é que ele aplique uma solução química, biológica, ou psicológica – que, muitas vezes, estão mais próximas do ideal (veja este outro post). Isso acontece porque cada um trabalha dentro de sua especialidade e, portanto, de sua limitação.

Técnicas como o Brainstorming trazem uma certa melhoria. É a tentativa e erro em grupo. As ideias tendem a ser um pouco mais abrangentes, mas, ainda estão limitadas pelo repertório disponível no conjunto das pessoas do grupo.

A TRIZ diferencia-se porque conduz os seus usuários, primeiro, a compreender muito bem os problemas e, depois, a considerar soluções que estão fora das limitações de seu conhecimento e experiência. A figura abaixo ilustra este aspecto, em que a busca de soluções não se dá diretamente a partir de uma compreensão (frequentemente, superficial e insuficiente) do problema, mas, buscando inspiração em problemas anteriormente resolvidos de forma inventiva.

A partir do problema original, o usuário da TRIZ procura, por meio de análise e abstração, chegar à formulação de um problema genérico – um dos que estão cadastrados na base de conhecimento da TRIZ. Cada problema genérico tem uma ou mais soluções genéricas, que são identificadas no passo de resolução. As soluções genéricas precisam, então, ser particularizadas, de forma que se chegue a soluções específicas. Estas últimas podem ser diretamente implementadas ou aperfeiçoadas, caso em que se repete a sequência abstração – resolução – particularização. Consideremos um exemplo.

Após a montagem do primeiro 737-300, a Boeing descobriu, para sua infelicidade, que foi cometido um erro de projeto e a distância entre a carenagem da turbina e o solo era muito pequena, fora das normas da aviação e que isto impossibilitaria a homologação da aeronave. Estudos foram feitos e, mesmo após mover alguns componentes para os lados e diminuir um pouco a carenagem, a distância ao solo ainda era insuficiente. Uma carenagem menor resolveria o problema, mas, então, a turbina não receberia ar suficiente para propelir a aeronave. Um reprojeto de grandes proporções atrasaria muito a produção e as entregas, gerando multas contratuais. Este é o problema específico. O que fazer?

O problema genérico pode ser formulado como uma contradição técnica – um parâmetro é melhorado e outro é piorado: uma carenagem menor resolve o problema da distância, mas, recebe menos ar. Outra possibilidade é formular uma contradição física: o diâmetro da carenagem precisa ser menor (para homologação) e maior (para aspirar ar em quantidade suficiente).

As soluções genéricas para uma contradição física são: separação no tempo, no espaço, no sistema e conforme uma condição. As soluções específicas precisam ser imaginadas – lembrando, aqui, que a TRIZ não substitui a criatividade humana, mas, a guia e estimula.

É possível imaginar uma solução em que o diâmetro muda conforme o tempo: quando o avião está pousado, é menor; quando no ar, é maior. A separação no espaço também é teoricamente possível, porque pode ser usado o espaço dos lados para aumentar a carenagem. Uma separação no sistema também pode ser criada, com parte da função de recebimento do ar da carenagem sendo alocada para elementos próximos, como a asa, por exemplo. A separação conforme a condição também poderia ser concebida.

A solução efetivamente utilizada foi esta da foto (separação no espaço). Note que as carenagens das turbinas são “achatadas” na parte inferior, sendo que o espaço lateral foi utilizado para aumentar a área e receber ar suficiente, atendendo-se, assim, aos dois requisitos contraditórios: carenagem “grande” e “pequena”.

Não tenho certeza se esta solução foi criada com uso da TRIZ, mas, é bem possível, porque centenas de engenheiros da Boeing foram treinados em TRIZ.

Quais as suas experiências com a tentativa e erro? Tem sido satisfatórias? Você acha que um processo mais estruturado poderia ajudar?

About the author

Engenheiro, professor, empreendedor e autor, Marco de Carvalho atua nas áreas de inovação sistemática, criatividade, desenvolvimento de produtos e gerenciamento de projetos.

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